Por Marcos Vieira | Fotos: Raissa Azeredo, em 22/07/25
A 17ª edição da Aldeia Multiétnica ampliou a presença de profissionais indígenas em sua equipe de Comunicação, garantindo maior diversidade de olhares nos materiais audiovisuais produzidos ao longo do evento. O resultado dos dez dias de trabalho intenso — em áudio, vídeo e imagem — carrega a marca de diferentes percepções, o que torna os registros tão ricos: um verdadeiro inventário de memórias vivas.
Seis comunicadores indígenas colaboraram durante a Aldeia Multiétnica: Jp Îasanã Tupinambá, Toyane Fulni-ô, Kena Marubo, Ramon Fulni-ô, Kauane Fulni-ô e Ester Xukuru. Eles atuaram não apenas como fotógrafos e cinegrafistas, mas também ajudaram na criação de roteiros e estiveram à frente das câmeras, apresentando, nas redes sociais, a cultura dos diversos povos presentes no evento.
Um dos destaques da 17ª edição foi o boletim diário em áudio com notícias da Aldeia Multiétnica, apresentado por Jp Tupinambá e distribuído via WhatsApp para a imprensa, indígenas, viventes, visitantes e membros das equipes organizadoras. Produzido com belas vinhetas e trechos de canções entoadas pelos povos, o boletim já integra o acervo da Comunicação da Aldeia.
Segundo o coordenador geral da Aldeia Multiétnica, Juliano Basso, o evento tem avançado significativamente em todas as áreas e na Comunicação não é diferente. “Com o Pontão de Culturas Indígenas, um projeto também tocado por nós, temos aprofundado a forma de trazer informações ao não indígena. Muitos desses comunicadores, inclusive, integram o Pontão como multiplicadores”, ressalta.
“Tê-los neste período do evento integrando uma equipe multiétnica que propõe narrativas novas sobre as lutas e pautas dos povos originários é também uma experiência poderosa de percepção de mundo e busca de soluções para o fortalecimento das pautas dos grupos que estão conosco”, completa Juliano.
A seguir, os depoimentos de quatro comunicadores sobre a experiência:
Toyane Fulni-ô | @thoyane
“A importância do meu trabalho é criar pontes”
“Não é a primeira vez que venho, e toda vez que estou aqui aprendo um pouco mais. Sempre me enriqueço, descubro novas culturas e novos povos. Entendo que a importância do meu trabalho como comunicadora é criar pontes. Conheci várias pessoas que me acompanhavam e eu nem sabia quem eram. Foi muito bom me aproximar de pessoas que nunca imaginei conhecer — muitos fotógrafos. Estou trabalhando com uma pessoa que sempre admirei, que é a Raissa Azeredo. Desde criança a admiro, e hoje trabalho com ela, o que é algo muito bom! Também conheci outros fotógrafos que admirava, das regiões de Alagoas e de Brasília. Então é muito enriquecedor, de verdade.”
Ramon Fulni-ô | @ramon_taxia
“Depois de 525 anos nessa luta de resistência, a visibilidade é essencial”
“Tenho experiência na área, mas aqui é algo único. Há uma intimidade maior com os povos, uma troca verdadeira de informações e vivências. As pessoas vêm comer na nossa casa e nós vamos à casa delas — essa troca é completamente livre. Cobrir tudo isso é muito gratificante para nós, que somos um povo historicamente ignorado, sobretudo em nossos costumes e tradições. Depois de 525 anos de resistência, a visibilidade é essencial para que vejam que somos gente como qualquer outra. Temos nossos trabalhos, nossos empregos, nossas tecnologias — temos tudo de que precisamos. A necessidade de cobrir este evento é enorme, e só quem vem aqui entende como é essa troca. Sempre acompanhei, mas nunca tive noção da dimensão que isso tudo tem”.
Jp Îasanã Tupinambá | @jptupinambaa
“Usamos a tecnologia como ferramenta de luta pelo nosso povo”
“Trabalhar aqui é algo indescritível. Gostaria de destacar um ponto que tem sido muito significativo para mim — e não sei como foi nas edições anteriores — que é a formação de boa parte da equipe por indígenas. Isso desmistifica aquela visão estereotipada e conservadora de que os povos indígenas não têm acesso, conhecimento ou interesse por tecnologia. Ter uma equipe de comunicação digital na Aldeia Multiétnica prova exatamente o contrário: não só estamos conectados com a tecnologia, como a utilizamos como ferramenta de luta em prol do nosso povo. Para mim, isso é um destaque fundamental. E a experiência de cobrir a Aldeia tem sido extremamente interessante, com uma equipe muito unida, que trabalha e se entrosa bem, aproveitando os recursos da comunicação e da acessibilidade para divulgar um evento tão importante para a sociedade civil, indígena e não indígena”.
Kauane Fulni-ô | @narriman.brt
“Defendo um mundo que tenha mais comunicadores indígenas”
“Trabalho com cinema desde 2019, faço documentários, participo de um coletivo e integro uma rede de mulheres indígenas. Aqui [na Aldeia Multiétnica], é diferente, porque tudo é mais corrido, é muita informação, e a gente acaba entrando nesse ritmo mais intenso. Mas eu amo o que faço, ainda mais por ser com nossos povos indígenas, principalmente ao mostrar nossa cultura e um pouco da nossa vivência. Acredito que o audiovisual e a comunicação servem para isso. Defendo um mundo com mais comunicadores indígenas. A presença de profissionais de diferentes povos é muito rica. Inclusive, acho que precisamos de mais iniciativas como essa, porque sempre temos algo a aprender, nunca sabemos tudo. Trabalhar juntos permite um aperfeiçoamento genuíno, uma troca rica de experiências, conteúdos e ideias para criar novos materiais”.