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CRÔNICA | Tecendo redes e sonhos em palavras no Encontro de Culturas

Por Sinvaline Pinheiro | Foto: , em 14/12/23

Entre tramas e raízes desafios e demandas na preservação da cultura tradicional em Goiás, São Jorge, no coração da Chapada dos Veadeiros, reúne no Encontro de Culturas uma diversidade de pessoas em busca de conhecer, aprender e viver a riqueza cultural dos povos .

 

São momentos de escuta de representantes das comunidades de várias partes do país, acolhendo demandas em busca de sustentabilidade  do cerrado e seus habitantes. Tecendo uma rede de sonhos as palavras vão surgindo: 

 

“Quanto mais local, mais valor global”.

“O artesanato é uma arte de acolher emocionalmente, uma descoberta de ofícios”.

“O turista leva na alma a história local em cada detalhe traçado pelas mãos de pessoas da terra”.

“A ancestralidade está no fazer do povo do cerrado”.

“Um turismo de lembranças e esperança”.

“Artesãos e raizeiros do cerrado, trazendo a sustentabilidade de forma perene”.

“Minhas raízes e artesanato não tem prazo de validade. Tudo que faço aprendi com meus pais. É uma arte de sobrevivência”.

“A gente usa o cerrado e cuida dele também. Tenho muito ciúme do Cerrado” 

“Cuidamos desde o modo de coletar os produtos no tempo certo, seja seca ou chuva com o cuidado para não machucar a planta”.

“O cerrado é nossa casa. Se ele acaba, nois morre também”.

“É sofrida a caminhada pra chegar no ponto de venda. Às vezes muito dura, como de alguns kalungas”.

“A estrada é esburacada entre montanhas, estreitas e perigosas”.

“O governo tem que ajudar nois a quebrar a Serra”, diz Fiota Kalunga. “A estrada é um batedor. Se quebrar a serra pode passar carro e nois sair pra vender os produtos”.

 “O cerrado é muito rico, tem de tudo, alguém diz que nossa região era o Corredor da Fome, tinha vergonha de dizer que era daquela região, com o cerrado sabemos que o cerrado é riquíssimo”.

 

Seu Manoel de Monte Alegre, kalunga, um líder que já foi até vereador local e hoje preside a associação, diz que antes a vida era mais difícil. Não eram reconhecidos e nem vendiam artesanatos. Às vezes as pessoas tinham vergonha de onde moravam. No passado, quando alguém perguntava ao morador onde era o kalunga, eles respondiam que não sabiam. Ninguém queria ser kalunga. Eram chamados de negros da arapuca ou outros apelidos. 

 

O ENCONTRO de Culturas foi o local de acolhida há 20 anos atrás e colaborou na valorização do povo e seu modo de fazer.  Começaram a vender os produtos como óleo de coco, buriti, mamona , as raízes medicinais e mostrar a dança, a cantoria e seus modos de vida. Tanto foi o progresso que hoje, segundo seu Tico, tá aparecendo gente de todo lado querendo ser kalunga.

 

E na roda de prosa se fez uma roda gigante de pessoas de Vão de almas, Guarani, Posse, Terra Ronca, Formosa, Pantanal, Monte Alegre,  Itumbiara, Palmas, Porto Seguro e tantos outros lugares diferentes dessa imensidão dos Gerais no Cerrado brasileiro.

 

O ENCONTRO segue sendo a casa de um povo rico e feliz,  com suas festas, danças, cantigas, alimentos, remédios e rios de águas limpas. É o ENCONTRO dos povos.

*Sinvaline Pinheiro é escritora, cronista e poeta. Há duas décadas é parceira do Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros trazendo registros do coração sobre o que vive e vê nos encontros que realizamos.